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Sandra Augusto - Co fundadora da DOCE BAGA

Estávamos em 2010, em plena crise económica. Sandra Augusto regressara de uma licença sem vencimento, em Timor Leste, para ser colocada num Departamento da Polícia de Segurança Pública que não lhe dizia muito. De espírito atreito a desafios, lançou-se então à aventura de criar uma empresa de Publicidade – uma das suas áreas de eleição. Cedo percebeu que, malgrado o seu empenho e paixão, o projeto “não ía dar em nada” e fechou a empresa. Essa clarividência e decisão tomada com objetividade e prontidão, foram providenciais. “Permitiram que ficasse alerta a outras oportunidades”, salienta.

A área da agricultura surgiu por acaso. “Num dia de viagem a casa dos pais da Ana, falou-se nos mirtilos e no apoio concedido aos jovens agricultores – no âmbito do PRODER  (Programa de Desenvolvimento Rural) - e como ambas nos enquadrávamos nos requisitos, resolvemos concorrer”.  O setor era um perfeito desconhecido e Sandra começou a estudar o bê-a-bá da framboesa e do mirtilo. Constatou que nas grandes superfícies, este era um produto caro e considerou, desde logo, que o mercado externo seria o foco.

Da candidatura, Sandra recorda as dificuldades encontradas e deixa um ensinamento.

“A parte trabalhosa foi a dos orçamentos. O IFAP financiava com 40 000€ para o arranque do projeto e com 60% das despesas elegíveis. Como os gabinetes de consultoria não apoiam os produtores na escolha do equipamento necessário e nós não tínhamos qualquer experiência, parte do mesmo não foi contemplada e acabámos por pagar do nosso bolso. Por outro lado, foi complicado não conhecermos as empresas a quem solicitámos orçamento, pois não sabíamos se estava correto.”

O segundo passo foi encontrar terrenos, “lendo os compêndios sobre os incentivos, verificámos que as freguesias desfavorecidas tinham um maior financiamento e foi essa a base da procura. Enviámos emails para tudo o que era agência e avançámos para o arrendamento agrícola – 7 anos – de um terreno com 3 hectares, em Canha, Pegões. Fomos as primeiras nessa região (agora somos 14 – e é a segunda maior zona do país de produtores com pequenos frutos)!

Quando a separação faz a força

Os apoios vieram “a tempo e horas”. Mas, para a instalação, a formação agrícola era essencial.  Sandra e Ana visitaram uma exploração agrícola em Abrantes “para ver como é que se faz” e depois, foi imersão intensiva!  Perceber de rega, o que são filtros, caudais, bombas, programadores, válvulas…!

Dotada de espírito curioso, Sandra gosta de aprender e isso, reconhece, “ajudou muito”. Acabou por se dedicar mais à parte técnico-logística e operacional da empresa e Ana à produtiva e à alimentação das plantas. Desta dicotomia entre as sócias, surgiu a complementaridade necessária para o sucesso do negócio. “É sempre bom existir esta dicotomia, igualmente nas situações em que que as coisas correm mal e uma de nós está em baixo. É mais uma ajuda, um incentivo para ir em frente. Como diz um amigo nosso também empreendedor: vocês têm-se uma à outra!”

O caminho faz-se caminhando

No mercado agrícola, o preço é um elemento de grande instabilidade e incerteza. Esta constatação fizeram-na as duas sócias, desde logo, e desde logo, quiseram contornar a insegurança que esta realidade lhes trazia na gestão do negócio.

Um acontecimento determinante, fê-las mudar o rumo da empresa.

“No primeiro ano, com o dinheiro que não utilizámos, conseguimos investir e arrendar outra quinta para cultivar mais meio hectare de framboesa. Mas, por desconhecimento, adquirimos uma qualidade que não era boa. Soubemos quem comprava fruta aos produtores, um comerciante perto de Leiria, só que este apenas nos adquiriu aquela de boa variedade e, de um dia para o outro, tínhamos já duas paletes da outra feitas, ele disse que não vinha buscar mais!”

As duas sócias perceberam a fragilidade desta relação e foram à procura de uma mais saudável. No segundo ano, começaram a aparecer mais produtores na zona, aos quais elas propuseram que se associassem para, em conjunto, encontrarem um comprador internacional. Apesar da recetividade do projeto, o mesmo ficou na gaveta porque era preciso injetar capital para criar uma empresa.  

A dificuldade faz o engenho e Sandra, munida do seu espírito positivo, arregaçou as mangas para pôr em prática outra solução. Em tempo recorde, criou a imagem da DOCE BAGA, o site e catálogos em inglês, para ir à Feira da especialidade, em Berlim.

“Vamos ver o que vai dar! Pensámos na altura. Fomos com um casal amigo, fundador da Berry Dream, que arrendara o terreno ao lado. Tínhamos reuniões pré-agendadas e conseguimos uma lista enorme de compradores!” Recorda.

 No regresso e para separar águas entre negócios, constituíram a Redfields que faz a compra dos frutos à DOCE BAGA, Berry Dream e a outros produtores e serve de plataforma de exportação.

Atualmente, com uma faturação de 500 mil euros, a Redfields, irá também fazer produção este ano, para garantir o volume das encomendas. “A produção agrícola é muito delicada, pressupõe grande disciplina e está sujeita a análises de qualidade rigorosas. Queremos com esta estratégia, colmatar eventuais falhas e assegurar a produção necessária”, explica.

Fazendo o balanço deste percurso, Sandra aponta os fatores essenciais num empreendedor “Não desistir, persistir. Então na agricultura, há problemas todos, todos os dias - ou porque faltam trabalhadores, ou o trator se estragou, ou uma válvula não funciona… “

E alerta, “no entanto, quando as coisas não correm bem, não vale apena insistir e fechar os olhos a uma verdade que não gostamos de ver e dou o exemplo daquele meio hectare no segundo terreno. Eu só tive aquela produção oito meses! Desde o momento em que o cliente comprador disse que a mesma não valia nada e em Berlim tivemos a perceção de que não iria ter aceitação, chegámos e arrancámos tudo. Coloquei outra produção, mais cara, e o que retirei dali compensou o prejuízo. Nunca trabalhei tanto como para esta empresa, mas é preciso que as pessoas percebam que não se vai ter o retorno e ficar rico no segundo, quarto ou quinto ano. Têm que se mentalizar que têm que trabalhar. Se não, nada acontece!”

INOVAR para CRESCER

Um dos pilares do negócio tem sido uma postura pró-ativa evidenciando-se em todas as fases.  No arranque, esteve presente na definição da cultura inicial - “A framboesa pode ter produção duas vezes por ano, como tal dá rendimento de seis em seis meses. Já o mirtilo, só passados dois anos. Assim, avaliámos a capacidade do terreno e plantámos dois hectares de mirtilo e ainda um hectare de framboesa, para manter a produção de mirtilo durante os dois anos.”

Muito embora já exista retorno, a estratégia tem sido reinvestir e o foco a melhoria das técnicas de produção (não o aumento da área de cultivo). O objetivo é evitar falhas na produção, facilitar o trabalho agrícola e assegurar um maior rendimento.

“Vamos fazendo experiências! Começámos na cultura em solo, depois percebemos que em vaso conseguimos ter uma produção mais precoce e por isso mais lucrativa. Assim, o ano passado, abdiquei de uma produção e puz tudo em vasos. Alterámos, ainda, o processo de rega convencional e colocámos uma central!” Revela.

A proximidade à terra e às gentes fez a diferença

“Há pessoas que compram o negócio chave na mão, mas não têm o sabor de pôr as mãos na massa, como nós e perdem uma série de coisas.  Todos os dias aprendemos, até a nível social e relacional!”

O primeiro ano foi muito trabalhoso e Sandra partilha as recordações desses tempos: “lembro-me de ir para a quinta às seis da manhã e sair à uma e meia da noite. De andar com as lanternas e as luzes de um trator velho que nos emprestaram (e que inicialmente nem sabia guiar) para fazer uns camalhões porque depois iam chegar as plantas. Comecei a dar muito valor ao que é o salário mínimo e a quantidade de trabalho que isso representa. De todas as tarefas, não há uma que eu não tenha executado. Todos os trabalhos novos, faço eu primeiro, vejo o tempo que demoro e depois dou as indicações.”

Sandra reconhece que a relação com a equipa é muito importante para a motivação e produtividade e tudo faz para a promover. Como sabe, por experiência, que o trabalho é cansativo, é frequente lançar um grito de incentivo para dentro da” linha” na colheita, ou fazer o acompanhamento daquele que está mais atrasado.  Ao transmitir-lhe, “vou-te ajudar para acompanhares o grupo” e ao disponibilizar o seu apoio personalizado, consegue incutir-lhe mais ânimo e em simultâneo, uma maior responsabilização.

“Os empregados gostam que estejamos com eles. O facto de trabalharmos com eles, as nossas almoçaradas conjuntas no campo, leva a que nos respeitem e reconheçam como patroas. Eles entendem que o trabalho agrícola é um trabalho de equipa e que dos bons resultados depende o seu emprego. Fazemos questão, sempre que há lucro, de dar uma percentagem no inicio do ano como forma de incentivo e reconhecimento. 

Reconheço que já ajudei muitos empregados em variados aspetos. É preciso estar atento. Interessa-me ter um trabalhador que trabalhe comigo durante anos.” Comenta.

As sócias valorizam, ainda, a sua integração na comunidade local. Sandra recorda: “A receção inicial foi de estranheza. Aquando da primeira colheita, aparecemos com os frutos no café, no vizinho, no senhor que nos ajudou… Para muitas pessoas foi a primeira vez que os provaram. Atualmente, sinto que a população à volta gosta de nós, talvez por termos sido as primeiras... “

Aprender com os erros

Para Sandra, o momento de maior dificuldade neste percurso fê-la gerar uma solução disruptiva e é, para ela, o mais gratificante também.

“Quando tínhamos as duas paletes feitas e o senhor disse que não queria comprar mais fruta - dez toneladas – pensei, o que vou fazer? Por outro lado, agradeço que isso tenha acontecido, pois fez-me procurar uma solução completamente diferente. O erro refletiu-se em aprendizagem. A maior satisfação que tenho da empresa é tudo o que aprendi e mesmo as dificuldades – os desafios que tive que superar. É um setor difícil mas não somos de desistir. Somos persistentes e procuramos arranjar sempre soluções para os problemas que ocorrem.” De espírito otimista, Sandra acredita que tudo é resolvido, mais tarde ou mais cedo, “Eu não tenho medo de nada. Não sei se é por aquele processo ter sido tão marcante e pela forma como o resolvi, que depois disso acho que consigo fazer qualquer coisa!”

Mulheres e homens no empreendedorismo. Há facetas femininas a destacar?

“Eu acho que as mulheres têm características essenciais neste campo. Creio que os homens desistem com mais facilidade ou desligam a ficha por momentos, perante obstáculos. Sempre trabalhei maioritariamente com homens e sempre que há mulheres, estas acabam por se destacar. Na realidade, conseguem fazer tudo e mais do que uma coisa ao mesmo tempo, dizem.”

Para aqueles que estão a pensar abraçar o caminho do empreendedorismo, ficam as recomendações finais de Sandra: “Têm que dar o passo e arriscar. Se encontrarem obstáculos devem saltar por cima e não devem desistir. E se o negócio não está a resultar, parar. O meu exemplo: tive uma empresa de publicidade, um projeto que gostava muito, mas durou apenas um ano e meio, pois percebi que só estava a gastar dinheiro e fechei-a. A tomada de decisões, na altura certa, é assim muito importante, seja favorável ou não.  Isso pressupõe saber olhar de forma racional e não pôr a parte emocional por cima.” Sobre a Ideia, adianta: “Com a crise, houve muitas pessoas que resolveram arriscar em novos negócios, às vezes são negócios simples, há-que saber olhar para as coisas como uma oportunidade de negócio”. 

Sandra evidencia o contributo das instituições bancárias no sucesso de um projeto de empreendedorismo e reconhece, no seu caso, o apoio sempre presente da CGD: “Se não tivessem acreditado em nós, no nosso projeto, tudo teria sido muito difícil. Se os bancos não acreditarem na ideia e no trabalho das pessoas, (porque há sempre um risco) e não desenvolverem um acompanhamento mais de perto, as empresas não conseguem singrar.”

Claro que a paixão é importante naquilo que se faz e Sandra e Ana atestam isso mesmo. Continuam a exercer a profissão de polícias mas é com um olhar brilhante e discurso entusiasmado que Sandra descreve a sua atividade na DOCE BAGA “É um dia a dia muito engraçado, por mim ficava lá o dia todo! “

Sementes do Futuro

Numa atitude pró-ativa, as sócias têm já os olhos no futuro “Gostaria de fazer a distribuição porta a porta, em Lisboa, de forma profissional, com qualidade. Para isso, preciso de tempo e disponibilidade mental para pensar a estratégia, criar uma marca e contratar um bom comercial.”

 

Entrevista realizada e artigo escrito por Leonor Batalha

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