Patricia Santos - Co- fundadora e Administradora do TRIVA GROUP
Numa conversa solta e discurso objetivo, Patrícia Santos aponta desafios, ditames e ensinamentos numa segurança comprometedora de quem escreve o seu caminho com ousadia e paixão. Sendo formada em direito, qual foi o chamamento para o mundo dos interiores e para o empreendedorismo? Desde jovem sempre tive um gosto especial pelos interiores e pela arquitetura do espaço. Alimentei este “ bichinho “ aliando o sentido estético, claramente subjetivo, a uma perspetiva real de criar algo muito objetivo. A empresa nasceu, então, há vinte anos, a dois, com o meu marido, estando eu focada na parte criativa. Aliar esta tendência espontânea a uma escala mais global, foi surgindo naturalmente. Quais os moldes do negócio na altura? Completamente invertidos em relação aos atuais, sendo que a vertente exportação tem estado sempre presente. À data, desenvolvia coleções de acessórios decorativos e pequenas peças de mobiliário que importava do Oriente para depois exportar. Utilizava a feira Maison & Objet, em Paris, como veículo expositivo e comercial para catapultar o negócio. Nos moldes atuais, o grupo só tem oito anos. Invertemos a estrutura passando a produzir localmente e exportar, quando o contexto nacional e internacional também se alterou. Como surgiu o clique que conduziu à mudança? Em 2007/2008, apercebemo-nos das exigências do mundo global e em crise, tendo constatado que não eram compatíveis com o nosso caminho. Em 2009, começámos esta inversão deslocando a produção para Portugal - quanto menos intermediação melhor. Não fazia sentido importar para exportar. Acabámos por antecipar um pouco o que iria acontecer e conseguimos “fazer a marcha atrás antes do precipício.” …e qual o exercício aplicado nesse processo de mudança? Introspeção. Ver que algo não estava bem no nosso modelo de negócio e antecipá-lo, implementando uma alteração. Olhámos para dentro da nossa estrutura, para o nosso país e verificámos que tínhamos imensas potencialidades. Estando aqui sediados, porque não produzir cá? Houve que ajustar os mecanismos e alterar as bases. – “Alterar os meios para atingir o fim”. Foram seis meses a criar um novo foco. Da crise, surge assim uma nova oportunidade de negócio? A cadeia produtiva passou a ser em Portugal e tal permitiu ampliar a oferta a um conceito global e abraçar projetos maiores. Permitiu, ainda, trabalhar a arquitetura do espaço, uma área que surgiu de forma natural e que me alicia particularmente. A proximidade à produção, tendo o nosso país como destino produtivo, foi uma excelente aposta. Temos ótimos artesãos, muita capacidade e estando perto do fabrico, maximizamos a estrutura e o controle de custos, serviços e qualidade. Conservámos o veículo de comunicação de há 20 anos, o Salão M&O e temos mantido os clientes e aumentado a carteira com novos. Desde logo, a faturação de 200 000 € no primeiro ano foi uma subida substancial! O que mudou? Tínhamos recursos próprios. O Investimento inicial foram cerca de 50 000 €. E fomos crescendo e criando riqueza com o” pêlo do cão”, com as mais valias da nossa abordagem, da sua tónica criativa,… pois não vendemos produto, vendemos um conceito integrado! Com a alteração do modelo de negócio tivemos que integrar outras categorias em termos de recursos humanos para garantir a verticalidade, pilar do negócio. Em 2015, adquirimos uma fábrica com 40 anos com ativo, passivo e trabalhadores, com recurso a crédito. Facilitou o fato de já estarmos no mercado e os bancos estarem mais abertos ao financiamento. Este arrojo era inevitável pois tínhamos já muitas solicitações a que não estávamos a conseguir dar resposta pois não tínhamos capacidade e estávamos a subcontratar estruturas que não dependiam de nós e não eram suficientes. Os primeiros 3 anos foram particularmente difíceis face ao contexto de crise do país. Em 2016, faturámos 16 milhões de Euros. Este ano conseguimos alavancar mais ainda o negócio. Como define atualmente a vossa proposta de valor? A verticalidade é o pilar do negócio e o fator diferenciador em termos de proposta de valor e que nos permite este volume de negócios. O core business consiste essencialmente na produção de interiores e no próprio conceito integrado design & build (conceção do projeto à implementação) assente e viável graças a várias estruturas que temos vindo a criar. Atualmente, o grupo detém duas marcas relacionadas com os interiores, dedicadas ao business to business e ao retalho: a Altto e Frato sendo esta a mais emblemática do mesmo. Integra 4 lojas: uma concessão no Harrods e lojas em Singapura, Xangai e Riade com parceiros locais económicos que ajudam no seu desenvolvimento. Uma caraterística em termos comerciais é não termos agentes. A nossa presença no mercado internacional foi natural, não foi dirigida, o que foi intencional foi o canal de comunicação - a utilização da feira M&O para divulgação, inclusive às cadeias de lojas. Estamos abertos aos mercados que manifestem interesse em nós. A própria presença no Harrods resultou de um convite, foram eles que nos “ descobriram “ e o mesmo para as outras lojas. A partir daí, fizemos a análise da viabilidade e capacidade de adaptação. Além das marcas próprias, existe uma estrutura produtiva do grupo, constituída por uma serralharia, uma fábrica de mobiliário, revestimentos e apainelados com 20000m2, adquirida em 2015- o músculo para alavancar o negócio de uma forma consistente,uma carpintaria dentro desta área física e ainda, uma empresa de projeto ligada ao contract e hotelaria. Qual a missão? Assumir o design & build - alargar esta cadeia de valor ao contract e reforçá-la no residencial, criando mais lojas próprias. Em junho de 2018, está prevista a abertura de uma loja própria no The Dubai Mall, no Dubai. A longo prazo, pretendemos criar 200 lojas a nível internacional. De facto, a parte criativa traz o valor acrescentado. Apresentar a proposta (que engloba desde o acabamento e decoração, à assessoria e passa pela oferta do projeto) gera fidelização e vontade de confiar todo o trabalho. É um meio para atingir o fim que é a adjudicação do projeto. Temos que ser verticais para fazer o trabalho completo e assim alimentar cada uma das estruturas um pouco. O somatório é quase o teorema de Pitágoras. Permite-nos essa competitividade face a terceiros e o apetite no cliente final. Mais-valia para o cliente: não gastando mais e num período de tempo mais curto, ter a sua casa pronta de fio a pavio confiando em profissionais da área, a nível global. Quais considera, assim, serem os vossos fatores diferenciadores? Sistematizando:
Quais têm sido os grandes desafios? No arranque, foi a ansiedade de saber se tínhamos tomado o caminho certo - aqui foi muito importante a auto-confiança e resiliência que é muito o nosso timbre; e ainda, a conjuntura nacional, a expetativa e incógnita do que se ia passar no país, na altura quase na bancarrota. O grande desafio inicial foi, assim, arriscar, mas como o “risco são ossos do ofício”, “fuga para a frente”. A parte mais desafiante no desenvolvimento do negócio são agora os Recursos Humanos: como motivar, gerir emoções, controlar. Para as lojas são selecionadas e formadas pessoas portuguesas que viajam e dão formação lá fora. Tentamos que haja um controle e uma linkagem das pessoas que estão no front-office - sendo que a sua seleção é validada aqui - uma aproximação que passa pelo conhecimento e visita à fábrica. Atualmente, temos uma pessoa que acompanha diariamente cada loja e outra que faz o link das quatro lojas de forma a garantir uma resposta atempada e o interface connosco, em termos de administração, e o resto da equipa. Esta expansão do número de lojas vai obrigar a uma relação muito estreita e ao alargamento da equipa formadora. Tal como numa casa precisamos de ter os pilares bem sólidos, é esse o segredo. O vosso passado permitiu-vos dar o passo fulcral. Quais os ensinamentos para o futuro?
O que vai mudar em si para passar ao outro patamar? Não falaria em mudança, propriamente, mas sim numa melhoria e aperfeiçoamento na gestão dos tempos, passando por delegar cada vez mais na minha equipa, garantindo colaboradores bem formados e muito competentes. Esta passagem a outro patamar, esta ambição de crescer não é numa expetativa material mas por puro prazer de ver realizar, fazer acontecer, crescer com as equipas, porque gosto muito do que faço. O que me move é o prazer de concretizar é como ter um diamante em bruto! A aquisição recente da fábrica permite uma capacidade de produção que ainda não está completamente satisfeita potenciando o volume de negócio. Já o objetivo das 200 lojas no futuro, não é uma ambição puramente economicista, pois vamos poder ajudar mais famílias para além das 140 já a nosso cargo! Ambição, na realidade, tem que ver com a capacidade inerente ao empreendedorismo, de criar mais, de crescer. Empreender no feminino – quais as diferenças? Nós mulheres, temos uma capacidade muito tridimensional da vida e isso ajuda muito- Somos mães, empreendedoras, donas de casa, mulheres. Se calhar é essa a nossa diferença. Como gere esse multi-tasking- como concilia a vida pessoal com a profissional? Nem sempre é fácil. Tento ser autodisciplinada. O facto de ser muito positiva também ajuda a que as coisas possam fluir. Sozinha ou acompanhada? Qual a importância da complementaridade neste percurso? Não estou sozinha. É muito importante a sinergia entre mim e o meu marido. Formamos uma boa equipa. O Carlos com enfoque no médio – longo prazo, eu na vertente criativa e do curto prazo. Marido em casa, marido no trabalho, outro tipo de gestão? Somos bastante diferentes e nesse sentido criamos uma boa equipa. Eu e o Carlos quando chegamos a casa desligamos completamente. Fazemos tabu do tema trabalho. É a nossa regra. Por questões profissionais também viajamos muito e conseguimos conciliar sempre com uma parte lúdica. Tentamos igualmente fazer viagens giras com os miúdos. Tem sido esta a receita que espero vá perdurar! Quais os conselhos para quem estiver a iniciar o seu percurso empreendedor Como características fundamentais de um empreendedor, saliento a capacidade de autodisciplina, de criar uma estratégia a longo prazo e de criar uma equipa – sozinhos não conseguimos completar as tarefas! Os meus conselhos aos empreendedores, de uma forma sistematizada, são:
Temos que nos pautar no dia a dia por atitudes que os colaboradores reconheçam. Só através da atitude é que vamos construindo esse reconhecimento. No nosso grupo a taxa de fidelização das equipas é muito alta. Há colaboradores que estão comigo faz 20 anos! Na realidade é como uma segunda família. Entrevista por: Leonor Batalha Santos Powered by: |